terça-feira, 29 de novembro de 2011

“Minhas Sinceras Desculpas”, com Eduardo Sterblitch


Essa é minha primeira crítica dirigida parcialmente ao público, assim como foi um dos únicos espetáculos que já assisti onde a crítica está para o público. Eduardo Sterblitch não é o César Polvilho da TV, personagem que apresenta o programa Pânico, na Rede TV. No palco, o ator tenta contar sua história através de uma tragicomédia, que é ligeiramente traduzida para humor pelo próprio público catequizado pela televisão e que esperava um encontro com os personagens do ator.

“Minhas Sinceras Desculpas”, que teve sua última apresentação no Citibank Hall, em São Paulo, não é um monólogo, tampouco foi um espetáculo que me arrancou risos, Eduardo é um ator de teatro, que ganha a vida fazendo humor na televisão. Sua experiência teatral, com o espetáculo, parece um despejo frustrado de sua trajetória cênica, o ator rebusca sua própria história e a expõe ás vistas do público de uma forma direta, utilizando exemplos da burguesia moderna e do comodismo humano, onde o público aprendeu a saciar-se apenas com a cultura televisiva.

Eduardo é um dos atores mais versáteis que conheço, e sem dúvidas uma das melhores revelações que surgiram nos últimos anos. Suas expressões, e as vezes a falta delas, contornam sua maneira pitoresca de fazer humor. Eram os personagens que o público esperava no palco, e ao público ele os deu. Ao início da peça somos surpreendidos com Paulo Autran, em áudio, recitando “José”, de Drummond. Eduardo também interpretou rapidamente uma gama de imitações levando a plateia ao riso, porém em seguida metralhou a todos com a verdade de seu texto. “Minhas Sinceras Desculpas”, segundo o roteiro, é um pedido de desculpas pelo comportamento escroto da sociedade atual, de suas mazelas e expectativas frágeis.

Sterblitch não preocupa-se em fazer o público rir, segundo sua recomendação no início do espetáculo, porém faz piadas no decorrer do texto retratando sua frustração para com as expectativas do público, e assassina um texto que poderia ser teatral, e mesmo assim é aclamado pelo público, que ora o odeia em cena, ora o adora. O texto, talvez não tenha estrutura, porque tem o propósito de tentar estruturar-se em alguma apresentação, onde o público não seja leviano à televisão, ou ao humor barato, mas ele desestrutura a plateia.

O ator coloca uma lupa sobre o público, porém de uma forma um pouco grosseira, sem importar-se com limites, abusa de sua liberdade humorística para explicar quem é o público do teatro, e porque eles esperavam um ator de televisão, ao invés do homem que cresceu no teatro. Em diversos momentos o público gargalhava sei lá do que, pois não havia motivo, nem para humor, nem para aplausos. Eduardo Sterblitch é um ator, porém ele mesmo precisa optar por desvincular sua imagem de seus personagens. Quando um ator não consegue passar a mensagem de um personagem sem retratar o personagem anterior, sua missão com o texto falhou.

O ator frustrado que subiu ao palco para revelar o que a plateia fazia no lugar de público, não me fez rir, assim como me trouxe momentos de reflexão. Não há como recomendar, ou não recomendar o espetáculo, até porque não se sabe se ele continuará as apresentações. O fato é que esta é uma peça inédita, com um “texto” que se constrói e se destrói em cena. Nem mesmo a resenha da revista Veja conseguiu definir o espetáculo, aliás, as resenhas da revista Veja nunca conseguem definir nada, talvez isso seja fruto de sua superficialidade jornalística. O texto do espetáculo utiliza quase todos os recursos do humor, menos a inteligência, pois ainda há uma lacuna desnecessária no roteiro, uma falta de sentido que fica perdida pelo caminho. A peça só atraiu o público pela fama televisiva do ator, esta que ele gostaria de apagar enquanto estivesse sob as ribaltas do teatro. Há uma beleza cênica, de figurino, de movimento, mas estão perdidas num texto que navega sobre uma interrogação. O ator fala muita coisa, e não interpreta nada. O espetáculo resume-se num número de stand up, com recursos e produção, para ser um monólogo é necessário um texto de monólogo. Mas, ao mesmo tempo, Sterblitch revela-se um clown do contemporâneo, um código da sociedade do espetáculo. E ser um clown é uma grande arte.

O cenário de Márcia Moon foi desenhado com preocupação ao clima do texto, e construído com perfeição. Durante o espetáculo uma banda estilo Jazz acompanha o ator, o interrompendo para apresentações musicais, esboçando um show a parte, com a direção musical de Marcinho Eiras, que traz ao palco três guitarras que são tocadas simultaneamente por ele. Os músicos trazem a elegância da música americana, a força da voz negra paralela as perfeitas cifras solfejadas e dedilhadas nos instrumentos. A iluminação de Osvaldo Vieira “Pelé” é uma saborosa fatia do espetáculo, que foi realizado pela EBPZ Empreendimentos Culturais.

segunda-feira, 28 de novembro de 2011

Roberto Carlos lota shows em São Paulo


Não é novidade para ninguém que Roberto Carlos mais uma vez deslocou inúmeros fãs para a plateia de seu show, que desta vez aconteceu no Ginásio do Ibirapuera, em São Paulo. Sempre com preços salgados, os ingressos esgotaram em poucos dias, havendo a necessidade de abrirem novas datas de apresentações, que só deram mais fôlego ao artista, que embalou sucessos de sua majestosa carreira.

O show, que deselegantemente começou com meia hora de atraso (no último sábado), iniciou-se com a orquestra entoando “Como é Grande o Meu Amor Por Você”, composição de Roberto feita em 1967, quando preparava um novo LP. Naquele instante o público era o coral, que anunciava o Rei com composições muito conhecidas, mas incansavelmente cantadas. A iluminação do show foi estrategicamente içada em barras e realizou um espetáculo a parte.

O roteiro do show ficou por conta de canções antigas que reuniu as mais saudosas vozes a cantarem, mas o clima romântico, típico das recentes apresentações de Roberto, foi substituído pelo embalo do rock’n roll, com canções do tipo “Quando”, uma das minhas preferidas de todos os álbuns do cantor.

Roberto Carlos nunca se anunciou como sendo Rei, porém creio que hoje lhe agrada esse título, como forma de carinho dos fãs e recíproca dos críticos. A verdade é que o palco é sem dúvidas o império de Roberto, e o público o coroa acertando todas as letras de suas canções. As rosas encerraram o espetáculo sendo lançadas para os fãs, todas com um beijo do Rei.

sexta-feira, 18 de novembro de 2011

Chiquinha Gonzaga renasce nos dedos de jovens pianistas


Não teria sido possível realizar um encontro entre Chiquinha Gonzaga e os jovens pianistas Alexandre Dias e Wandrei Braga, pois antes mesmo que os dois poetas das teclas tivessem vindo ao mundo, a primeira mulher a compor uma canção no Brasil deixara os saraus da vida, para os do céu. Foi aos onze anos de idade, que Chiquinha começou a compor, e agora, em 2011, os pianistas Alexandre e Wandrei reuniram, junto ao Instituto Moreira Salles, um acervo digital da compositora, e o lançaram nas cidades do Rio de Janeiro, Brasília e encerraram em São Paulo.

Francisca Edwiges Neves Gonzaga, conhecida como Chiquinha Gonzaga, nasceu no ano de 1847, filha do general do Exército Imperial Brasileiro com uma humilde negra, que passou-lhe nos genes o gosto pelos ritmos populares, entoados em rodas pelos escravos. Chiquinha frequentava os encontros destes povos e buscava inspirações para suas futuras obras. A primeira mulher a se expor tocando um instrumento e compondo canções separou-se do primeiro marido e foi impedida de criar os filhos menores, ela passou a tocar em troca do sustento do filho mais velho, o que pôde criar.

Chiquinha introduziu as mais influentes partituras no teatro brasileiro e fundou a Sociedade Brasileira dos Autores Teatrais, ao todo ela compôs 77 músicas para peças. O pianista Alexandre Dias, em sua apresentação em São Paulo deixou a força de Chiquinha Gonzaga tomar-lhe no palco e interpretou uma dessas peças, tocando a introdução do primeiro ato de “Fantasia”, o que lhe rendeu ovação e muitos aplausos. Aquela interpretação foi além do que se pode emocionar, o pianista compactuou com a compositora o mesmo talento em frente a um piano, e demonstrou a afinidade com as teclas e a paixão que sente por elas.

Chiquinha Gonzaga adentrou com suas composições no Palácio do Catete, sede do Governo brasileiro no Rio de Janeiro. Ela era amiga da primeira-dama Nair de Tefé, que casou-se com o presidente Hermes da Fonseca. Chiquinha foi duramente criticada por tocar um maxixe nas dependências do Palácio, e mesmo assim tornou esplêndido diversos ritmos que fizeram sucesso em seus dedos pelas teclas, as polcas, valsas, tangos, fados, lundus, quadrilhas e serenatas, além do choro, que marcou sua carreira a intitulando como primeira chorona brasileira. As canções “Linda Morena” e “Carijó” foram relembradas por Alexandre Dias, com total maestria.

O pianista Wandrei Braga calou-me de emoção e deixou meus ouvidos chegarem ao piano que posto sobre o palco vazava aquela famosa composição de Chiquinha, “Lua Branca”, também trouxe ao teatro as canções divinas “Agnus Dei”, “Ave Maria” e “Prece a Nossa Senhora das Dores” em adaptações para piano solo. Os olhos de Chiquinha Gonzaga passeavam pelo palco celebrando-se no cenário ao fundo, que mostrava-nos silhuetas de partituras, frases e fotos da compositora. A polca “Atraente”, grande sucesso, contagiava-me com a vontade de sair bailando pelo teatro. O sorriso tímido de Chiquinha era quase igual a timidez de Wandrei, que cada vez que olhava para o público buscava o fôlego vivaz para mais uma canção que beijava o lindo piano.

Ninguém jamais me fará tirar da cabeça que o piano é o mais lindo entre os instrumentos, ele é a regência de vorazes orquestras e o coração destes dois pianistas, Alexandre Dias e Wandrei Braga, que deram mais uma vez os merecidos aplausos e méritos a Chiquinha Gonzaga. Ontem (17) o suntuoso Teatro Humboldt estava vazio, mas ganhou as poltronas com cada nota que corria as fileiras. É uma pena que a cultura ainda atinja poucos, e a informação sobre estes eventos não seja valorizada. Os ingressos não custavam mais do que 10 reais, além disso um quilo de alimento substituía o valor.

O acervo digital, reunido pelos pianistas e o Instituto Moreira Salles, está livre para acesso e nele encontram-se as obras inteiras da compositora que estreou a música popular brasileira, no site www.chiquinhagonzaga.com.br. O projeto é incentivado pelo Ministério da Cultura e patrocinado pela Natura. Espero sempre os encontrar por todo canto, espelhando a musicalidade popular de Chiquinha Gonzaga e sua genial maestria de fazer música, regendo-se pelos galãs dedos de Alexandre e Wandrei. Assim como ela entrou pra história, os dois continuam tecendo-a e fazendo-a.