quarta-feira, 18 de março de 2015

Fábio Jr. traz músicas escolhidas pelo público em shows

Foto: Gabriel WickboldNo último final de semana o cantor Fábio Jr. apresentou o show "O Que Importa é a Gente Ser Feliz", no Citibank Hall, em São Paulo... é lógico que a mulherada estava em peso. Como se não bastasse reunir uma lista recheada de mulheres na vida pessoal, Fábio tem uma maior ainda quando o assunto é fã. E para seduzi-las ainda mais e valorizar o trabalho, músicas dele foram disponibilizadas na internet para que o próprio público pudesse escolher algumas que estariam no show. Nem sempre dá pra ouvir o público, mas é bom sempre tentar ouvir. Tem gente que não ouve, mas também não canta mais!Fábio gosta de um toque mais sofisticado aos seus palcos, o que talvez não permita inusitar e diferenciar suas apresentações. A iluminação é o que reveste o cenário, bem aplicada.

Quando o cantor casa sua voz aos momentos acústicos, o show ganha um tom mais íntimo e mais agradável. O acústico pode ser perigoso, por revelar certas falhas de afinação, mas o Fábio esta bem nesse quesito!
Canções como "Alma Gêmea" e "Caça e Caçador" já estavam na boca do público e são aquelas mesmas teclas que o cantor tem que bater sempre em seus shows. E isso é bem válido. Uma coisa é ouvir em casa, outra coisa é estar em frente ao artista enquanto ele repete aquela música que você tanto ouve. Confesso que não sou de ouvi-lo, mas me agradam muitos os duetos e algumas apresentações dele. Não creio que o Fábio tenha que se reinventar, isso é coisa daquelas bandinhas que surgem e rapidamente perdem a força. O cantor tem que manter sua performance, mas usar de artifícios novos para surpreender o público. Ou então, mesmo que ele faça um show a cada um ano, eles serão sempre iguais. O Fábio tem um pouco disso, a falta de novidade. Mas, ainda essa falta de novidade preserva um Fábio bom de ouvir!
A agenda do Citibank Hall incluí Ana Carolina, ainda neste mês, e nos próximos Paula Toller e Zeca Pagodinho, entre outros.

segunda-feira, 16 de março de 2015

Maria Bethânia traz 50 anos de carreira para show em SP

Maria Bethânia. Foto: Nyldo MoreiraUma bagagem repleta de um repertório primoroso, escolhido delicadamente e com um nobre rigor! Maria Bethânia desceu os atabaques em terras paulistas para comemorar seu jubileu nos palcos. São 50 anos de história de uma das maiores intérpretes do Brasil... aquela que da a voz que qualquer compositor deseja às suas canções. A baiana descarregou litros de composições que estavam incubadas há algum tempo e relembrou suas consagrações nas arenas brasileiras. De Santo Amaro da Purificação para o mundo, com o mesmo ‘jeitinho’ brejeiro. Uma overdose de Caetano Veloso para dobrar os ouvidos do público! Em São Paulo, no HSBC Brasil, estreou no último sábado, 14, uma das coisas mais lindas dos palcos nos últimos tempos, "Abraçar e Agradecer".
Li, outro dia, a respeito do repertório de Bethânia durante esses 50 anos que passaram, era uma crítica bastarda... dizia que a baiana enfeitava o mesmo do mesmo em todos os seus shows. E qual seria a dificuldade em entender gêneros?! Bethânia é dos batuques... quando sai deles enluara-se com canções de Chico Buarque, por exemplo, que a derruba em uma delicadeza incomum. O resgate de canções é a coisa mais sublime que um intérprete pode fazer para a música. Bethânia, com uma banda sempre simétrica, redesenha o ritmo dessas canções e costura uma a uma criando histórias nos palcos.
Em um espetáculo quase sem pausa entre as canções, divido em dois atos, com um recheio instrumental feito por Jorge Helder (contrabaixo), Túlio Mourão (acordeom e piano), Paulo Dafilim (violão e violas), Pedro Franco (violão, bandolim e guitarra), Marcio Mallard (cello), Pantico Rocha (bateria) e Marcelo Costa (percussão)... Bethânia exprimiu quase tudo de si. Dividiu suas interpretações em textos de Waly Salomão, Fernando Pessoa, Clarice Lispector e até os de sua autoria. Entre as ligeiras viradas de acordes a intérprete soletrou: "agradeço aos amigos que gostam de mim. Apesar de mim". E reverenciou o público: "agradecer aos senhores que acolhem e aplaudem esse milagre", o de cantar, e assinou embaixo.
"Abraçar e Agradecer" é uma reunião de poetas e compositores que transcende à própria carreira de Bethânia. Há um bom tempo eu não me deparava com um trabalho tão belo. Como se nada fosse ensaiado... mas, com a impressão de que tudo estava milimetricamente ensaiado. Nada fugia da natureza santamarense, de como se a baiana sambasse no quintal de casa.
Maria Bethânia. Foto: Nyldo Moreira
A overdose de Caetano Veloso incluiu a abertura do show, xerocando a intérprete para todo o resto do espetáculo. "Eterno em mim", de 1996, antecedeu uma leitura assinada por Bethânia. Ainda das mãos e da mente do irmão, "A Tua Presença Morena", com um arranjo carnavalesco de um samba rasgado, "Tudo de Novo", "Nossos Momentos", "Eu e Água" e "Motriz" saíram da intimidade vocal da cantora, como se Caetano a ciceroneasse com a viola. Algo parecido com o que aconteceu no documentário dirigido por Andrucha Waddington, "Pedrinha de Aruanda", em que Dona Canô divide o quintal com os filhos e com o mundo!
Chico Buarque entrou luxuoso no repertório do show com "Tatuagem" e "Rosa dos Ventos", que marcou como digital a carreira de Bethânia. Chico é uma das quedas da cantora, e sua total entrega para essas canções evidencia isso.
Dori Caymmi também está imperativo no espetáculo e veste o olhar de Bethânia com sua herança para compor. Rolando Boldrin, Tom Jobim e Chico Sá também apitam nesse terreiro. Boldrin é lembrado com "Eu, a viola e Deus", com viola caipira. Tom, com uma versão íntima de "Dindi". Chico com as digitais que deu a Bethânia. É o grande biógrafo da cantora neste momento. "Agradecer e Abraçar" também foi a canção de Gerônimo e Vevé Calazans, que fez a Abelha Rainha espetar minuciosamente seu ferrão em nós, o público.
"Não me arrependo de nada", foi um dos versos entoados na canção que eternizou Edith Piaf. Sim... Bethânia encarou "Non, Je ne Regrette Rien", de Charles Dumont e Michael Vaucair. A canção levada até Piaf e que simbolizou toda sua vida, também caiu na lábia de Bethânia, que interpretou o francês com seu jeito baiano e pontual. Ela encarou a canção de frente e finalizou flechada por luzes brancas e os braços pro alto, como quem reverencia o tempo.
Maria Bethânia. Foto: Nyldo Moreira
O samba de roda não veio latente como de costume nos shows de Bethânia, mas veio espalhado no vasto roteiro. Desta vez, Roque Ferreira ficou com a fatia sambada do espetáculo. Suas composições fizeram o vestido que transava vermelho e dourado em Maria Bethânia rodar como das mais legítimas baianas que encaram a ladeira do Pelô. A beleza teatral de tudo isso vinha trajada pela direção de Bia Lessa e Guto Graça Melo. A banda foi orquestral e respirava cada canção com alegria. Era muito contemplativa a maneira com que eles rodeavam Bethânia para enchê-la de notas.
O figurino ficou divido pelos dois atos. No primeiro, Bethânia vestiu o dourado de Oxum, e saudou-a no segundo ato com a "Oração a Mãe Menininha", de Dorival Caymmi. A introdução da música veio a cappella, como se aos pés da Mãe reverenciasse algo, intimamente. Ainda sob a assinatura de Gilda Midani, o segundo figurino era vermelho e dourado, tal qual o de Iansã na composição de Roque Ferreira, "Vento de Lá".
Maria Bethânia. Foto: Nyldo Moreira
Algo muito interessante foi o chão de LED armado sobre o palco e que ocupava quase toda sua extensão. Imagens de rosas, água, mato, estrelas e desenhos criavam uma atmosfera a traduzir esse jubileu e a desenhar a interpretação de cada canção. Esse chão era inclinado, o que fazia a pisada da cantora ficar ainda mais enrijecida e cúmplice do palco. Cantar sobre uma ladeira é coisa de um bom baiano, de raça. A vista do alto é sublime, a valsa de Bethânia sobre as imagens é celestial. A iluminação de Binho Schaefer riscou o palco como um pintor ama suas telas pincelando-as com critério.
Maria Bethânia. Foto: Nyldo Moreira
O texto já está ficando grande demais... é melhor encerrar assim, no ápice. Bethânia fez isso, voltou ao ápice, do qual nunca saiu. Terminou o show traçando no rosto uma interpretação visceral de "Cárcara". E voltou sorridente para o bis, sem deixar dúvidas de que cantaria "O que é O que é", de Gonzaguinha.
A tradução dos 50 anos de carreira de Maria Bethânia foi magistralmente resumida. O show é uma resenha de um Deus!
O show segue no próximo final de semana, no HSBC Brasil. Mas, os ingressos já estão esgotados.

quarta-feira, 11 de março de 2015

Fafá de Belém só precisa de sua voz e um piano

Dona de uma das maiores vozes do Brasil, Fafá de Belém apresentou um show intimista, ao lado do pianista Luiz Karam, no Terra da Garoa, em São Paulo. Destilando canções famosas, o espetáculo comemorou antecipadamente, no último final de semana, o Dia Internacional da Mulher... muito bem representado! Fafá aniquilou o silêncio com terminações gargalhadas e um timbre sem igual.

Em uma cama emaranhada de notas amaciadas pelo maestro Luiz, Fafá começou a bordar o espetáculo com "Foi Assim", e não hesitou ao interpretar canções imortalizadas por Maysa. Foi como a fusão da melancolia com o contentamento ao ouvi-la resgatar, naquele mesmo tom, as audaciosas articulações de Maysa.
O "Bilhete", de Ivan Lins, vinha escrito com a notável emoção de Fafá, enquanto que canções de Chico Buarque, como "Sob Medida", inundavam a sensualidade de uma mulher que esqueceu de envelhecer. Fafá não deixa nada fazer falta... sua voz e um piano são o casamento perfeito.
Fafá deixa qualquer jornalista muito redundante, porque, quando não estamos falando de sua exuberante voz, falamos dos seus avantajados seios (com todo o respeito, claro!). Temos que pautar também sua elegância e até a transição para interpretar e dramatizar conforme as letras. Parece domar a poesia como se trotasse sobre ela!
Essa máquina de ritmos passeou por diversos compositores... entregou-se à intimidade que a casa permitia e emocionou, como se desse recados em forma de canção. Saio sempre dos shows da Fafá sem saber com o que compará-la. Claro, não há!
O Terra da Garoa vem realizando experiências gastronômicas com artistas na casa. Um jantar, com entrada e sobremesa, precede o show. Além dos pratos que já estão no cardápio, o artista também sugere algo. Não sei dizer o sabor, porque não experimentei!
A agenda da casa inclui um musical com José Rubens Chachá e Tobias da Vai-Vai, o "Sampa", que conta a história do samba na capital paulista. Ivan Lins, Toquinho, Benito de Paula e Guilherme Arantes também apresentam-se nos próximos dias.

segunda-feira, 2 de março de 2015

'É possível ter ensino de qualidade na escola pública', diz Maria Bethânia

Foto: Nyldo Moreira
O espetáculo, que nasceu há alguns anos na Universidade Federal de Minas Gerais, ainda ganha o Brasil em uma costura de canções e poesias. Maria Bethânia responde à mediação entre poetas e compositores emprestando-lhes a voz, a dramaticidade e a alegria de uma cantora que é atriz. Ou de uma atriz, que é cantora! Comemorando seus 50 anos de carreira, a baiana espalha espetáculos no Brasil e enche São Paulo de poesia. Foram quatro dias de "Bethânia e as Palavras" no Sesc Pinheiros, que encerrou ontem com um grito de alerta da artista: "é possível ter educação de qualidade em uma escola pública"!

Bethânia vem avisando nesses anos todos de carreira de que a poesia deveria estar na boca do povo e no contexto de uma sala de aula. Exalta o professor e toma como referência aqueles que a ensinaram na escola. A voz de Fernando Pessoa ecoa toda a intensidade do poeta e para mim não há ninguém que o leia com tanto empréstimo e apreço. Há uma intimidade irresvalável entre os dois!
A poesia faz-se a interlocutora entre a palavra e a paz. Cada som vindo das batucadas de Carlos César e dos violões de Paulo Dafilin também soam feito poesia. "Bethânia e as Palavras" é um estado de poesia.
Alguns textos são devera interpretativos. Parecem a briga entre Deus e o Diabo, ou o pecado de Eva e Adão... ou qualquer prece a um Deus... a um orixá, ou a um homem. Parecem a natureza respirando. O som de Maria Bethânia parece bem com natureza respirando. Doce e selvagem.
Eu já assisti a este espetáculo diversas vezes, porque ele é incansável e terapêutico. Cada vez que o vejo descubro uma palavra nova, uma lágrima diferente e um sorriso mais aberto ou mais tímido, dentro de cada verso. Parece que há uma poesia nova em cada espetáculo, mas o que há são novos olhares e disposições auditivas que nos levam a emoções diferentes. A poesia está para a psiquiatria muito mais do que a psiquiatria para a medicina. Sem qualquer desmerecimento! A poesia é uma didática precisa, imediata e até duradoura.
Não há um só momento em que a poesia descanse no palco de Bethânia, a não ser sob a beleza do silêncio em que o público respira e nos intervalos métricos entre uma palavra e outra. A poesia permite o berro e o silêncio em um verbo!
Bethânia fará apresentações novamente em São Paulo ainda este mês, no HSBC Brasil. O Show "Abraçar e Agradecer" traz músicas do álbum "Meus Quintas", pela Biscoito Fino, e será em comemoração aos 50 anos de carreira. Os ingressos já estão esgotados.