segunda-feira, 29 de novembro de 2010

“O Pelicano”, de Strindberg e todo seu sangue em texto


Talvez seja um dos dramas de maior introspecção já escritos, August Strindberg foi citado por Nietzsche e Freud por sua obra que trata dos anseios familiares, do retrato obscuro que há numa família, o autor traça um diálogo com o ego dos personagens e seus atos, a peça “O Pelicano” é uma obra prima daquelas que se é possível entender como pinceladas expressivas de um artista em sua tela retratando sentimentos. Com direção de Denise Weinberg, corpo, mente, voz e sentidos contornam uma tragédia familiar, onde a destruição do lar é dirigida pela matriarca. “O Pelicano” está em São Paulo desde o ano passado, muito bem produzida no Viga Espaço Cênico.

A maçonaria emblema o pelicano como uma ave que alimenta os filhos com o próprio sangue, essa foi a personagem principal para justificar o texto do sueco Strindberg, criar um cenário de decadência familiar pelo esgotamento dos sentimentos afetuosos distancia a figura materna de uma ave dedicada, neste ponto é que o roteiro exibe o pai, um homem já morto, como o pelicano que já deu aos filhos sangue enquanto o seu se acabava. A matriarca da família, interpretada por Sheila Gonçalves, “mata” seu marido por desgosto, aquele que passava a vida dedicando-se aos filhos e balançando-se numa cadeira da sala, seus dois filhos vestem o luto do falecimento do pai, Flavio Barollo interpreta um jovem bêbado, que encontra no álcool a fuga de uma família que se dissolveu. A mãe avarenta cerca-se de seus privilégios adquiridos por artimanhas sórdidas e obriga a filha, vivida por Patrícia Castilho, casar-se com seu amante, interpretado por Flavio Baiocchi, um homem capaz de atos grotescos para impor-se o homem da vez.

O texto vigora uma categoria indiscutível, o intrínseco psicológico que há no roteiro fisga o espectador para cenas expressivas e nada monótonas. Já quando entramos ao teatro, que por sinal é muito quente e sem qualquer circulação de ar, os atores já introduzem os impactos que encenarão no espetáculo, cubos, em volta de um tablado posicionado ao meio do palco onde desenha-se a sala da casa, sentam os atores quando estão fora da cena, porém exibem movimentos corporais impactando as cenas. Inês Aranha é a preparadora corporal. A sala do espaço Viga acompanha a mesma clausura da história que foi encenada há anos em Estocolmo, do mesmo texto, onde a família e seu holocausto torna explicita sua autodestruição. A direção de arte de Carlos Calabone realça as pinceladas de Strindberg no drama.

O palco veste luto, assim como os atores, o vento e os gritos sublinham o medo da mãe por toda maldade que carrega, esse é o único sentimento que a confronta, a culpa casada ao medo. A atriz Sheila Gonçalves resume todo o sentimento acuado e ações cruas em suas expressões bem encenadas, assim como Patrícia Castilho que configura sua inocência e pureza na voz e nos movimentos, a dupla de Flávios, o Barollo e o Baiocchi exploram o interior de seus personagens e os expõe com total entrega aos papéis, impressionam, sensibilizam e assustam os olhares do público. A atriz Lilian Blanc vive a morbidez da governanta que traz o gancho para toda a história da família, com participação fundamental para a estilização gótica que o espetáculo me passou.

A iluminação de Wagner Pinto e a direção musical de Eduardo Agni explicam o teor do espetáculo com grandes acertos, não há nada exagerado, nem de menos, os limites são categoricamente respeitados. Os cabelos, o figurino e toda montagem dos personagens dão um bom tom à peça. A locação do espaço é uma conservação ao que se criou na encenação da peça em Estocolmo, porém a ventilação que deveria ter na plateia é uma forma de respeitá-la, a boa acomodação das pessoas influí na atenção ao discurso.

O Viga Espaço Cênico, em São Paulo, abriga a discussão dramática da família retratada por Strindberg, com produção de Luque Daltrozo e produção executiva de Leandro Viana, realização de Delana Produções, Cia Mamba de Artes e Projeto Viva Cultura, a peça “O Pelicano” da um exemplo de uso dos incentivos culturais, aos sábados 19h o espetáculo é gratuito para ONGs e escolas, às 21h também têm apresentação, e aos domingos 19h, até 19/12. O ingresso custa R$ 10,0 e a meia R$ 5,0. Fotos: Zuza Blanc.

segunda-feira, 22 de novembro de 2010

“Mamma Mia!”, para relembrar e fazer sucesso


Um dos mais famosos musicais do mundo está no Teatro Abril, em São Paulo, com realização da tradicional Time For Fun, “Mamma Mia!” chegou por aqui com todos os aparatos da versão original . O libreto de Catherine Johnson, com músicas e letras originais de Benny Andersson e Björn Ulvaeus, a versão brasileira é de Claudio Botelho. Inspirado nos hits do Abba, desde o dia 11 de novembro está em cartaz na capital paulista, marcando mais uma das 270 cidades por onde o musical já passou. O espetáculo traz cenários e figurinos idênticos ao original, porém a direção das cenas carimba erros, onde os personagens principais atuam com uma certa frieza e falta de química, deixando os coadjuvantes, se assim podemos os chamar, destacando-se muito mais.

A história se passa nos anos 70, numa ilha grega, onde Sophie Sheridan, interpretada por Pati Amoroso, anseia conhecer o pai às vésperas de seu casamento com Sky, vivido por Thiago Machado. A mãe de Sophie, Donna Sheridan é interpretada por Kiara Sasso, que teve três passados relacionamentos, deixando a dúvida de quem é o pai de sua filha, Carlos Arruza dá vida ao personagem Bill Austin, Cleto Baccic faz Harry Bright, e Sam Carmichael é interpretado por Saulo Vasconcelos. Os três são convidados ao casamento, fazendo a história girar em torno de cenas animadas e cômicas. Tanya, interpretada por Rachel Ripani, e Andrezza Massei que vive a personagem Rosie, são amigas de Donna, juntas formavam um grupo que cantavam os sucessos do Abba, como convidadas ao casamento, as três revivem essa época e dão um ritmo bem animado ao espetáculo.

A direção é de Floriano Nogueira, que também assina a impecável coreografia do musical. O estilo brasileiro de fazer música, foi incorporado aos sucessos do Abba, Paulo Nogueira é o diretor musical que rege uma das melhores orquestras de musicais, as guitarras de Fernando Presta e Jorge Ervolini encontram o baixo de Mauro Domenech e dão um show a parte, é possível sentir-se numa discoteca 60's assistindo ao musical. Essa é uma banda de rock orquestral, que vai muito além da grandiosidade de uma orquestra, agrupando habilidades musicais e pautando notas muito bem compassadas. Rachel Ripani já havia me encantado com sua voz no espetáculo “Vamos?”, em que deixou seu papel para atuar no “Mamma Mia!”, sua personagem Tanya ganha um timbre robusto e sublime, onde sua respiração acompanha as pausas e as falas com uma disciplina musical impecável. Saulo Vasconcelos e Kiara Sasso repetem o show de suas vozes, o mesmo que deram quando encontraram seus personagens em “O Fantasma da Ópera” e “A Bela e a Fera”, em “Mamma Mia!” os dois não condensam uma boa química, mas não deixam de adocicar os timbres e aquecer os aplausos do público. Thiago Machado, Andrezza Massei, Cleto Baccic e Carlos Arruza completam o time do coral, cada um com sua peculiaridade vocal, onde se encontram num belo arranjo. Pati Amoroso, ao viver o papel da jovem Sophie não pode descartar o timbre pueril, porém ainda é um tom muito virgem, um tanto irritante aos ouvidos.

O figurino repete o croqui original, Genevieve Petitpierre assina a supervisão de figurino e não deixa escapar sequer uma linha das roupas, toda a costura ajusta-se maravilhosamente bem ao corpo dos atores formando um belo conjunto na cena. O designer de luz, Howard Harrison preserva o clima praiano de uma ilha paradisíaca da Grécia, com os tons azulados mesclando a iluminação do mediterrâneo. O cenário é prático e dinâmico, basta apenas retratar a taberna de Donna, os quartos da pousada e a parte externa do bar, tudo usando a mesma estrutura. O musical dividi-se em prólogo e dois atos, o entreato é feito pela orquestra com notas da música "Gimme Gimme Gimme (A Man After Midnight)", do Abba, que anos depois teve sua base (sample) usada em Hung Up, de Madonna, escrita por ela, por Stuart Price, Benny Andersson, e Björn Ulvaeus.

A encenação de Kiara Sasso não é brilhante quanto sua voz, há uma certa frieza com sua personagem, onde atriz e papel ainda estão distantes, assim como Saulo Vasconcelos que entra duro em cena, sem recursos artísticos, com falha de direção ou falha própria, canta muito bem, mas fala mal, falta expressão, movimento e proximidade ao personagem. Cleto Baccic dá um banho de interpretação, desde sua atuação em Cats eu tenho gosto ao aplaudi-lo, assim como Rachel Ripani que dota-se de um humor peculiar para expôr sua personagem. De humor então, Andrezza Massei ganha o carinho do público, sua dança, seus movimentos, expressões lhe dão grande importância para a leveza do espetáculo. Thiago Machado carrega uma bagagem ótima, acredito que em breve brilhará nos papéis principais de musicais, assim como foi grande em “Meu Amigo Charlie Brown”. Os atores que interpretam os coadjuvantes também valem aplausos e a eles digo “bravo”. O musical “Mamma Mia!” traz ao palco a panelinha que há em vários outros já apresentados, talvez esteja na hora de reciclar a seleção de elencos, gente talentosa tem de sobra. Eu recomendo o musical, porém ainda precisa melhorar na maquiagem, nos penteados de alguns, porque tudo ainda parece muito luxuoso, quando a história se passa numa ilha.

O musical “Mamma Mia!” está no Teatro Abril, um dos mais apropriados para espetáculos musicais, em São Paulo quartas, quintas e sextas, às 21h; sábados às 17h e 21h; domingos, às 16h e 20h. Quem sente saudades dos anos 60, 70 e 90 o musical está bem apropriado, “Dancing Queen”, “S.O.S”, “The Winner Takes It All”, “Money, Money, Money”, “Mamma Mia” contagiam o público com traduzidas e também em suas versões originais, cantadas ao final do espetáculo numa espécie de show, e claro “I Have a Dream”, que dá voz a mais bela das cenas do espetáculo. O musical comercializa os ingressos pela internet no site da Ticket For Fun e nas bilheterias associadas, assim como no próprio teatro, os valores estão entre R$ 80,0 e R$ 240,0. Fotos: Caio Gallucci.

segunda-feira, 8 de novembro de 2010

Ticket dá a largada para a 4ª Semana de Cultura & Esporte em SP


A empresa Ticket, que atua no ramo de voucher para alimentação e serviços sai na frente com mais uma ação cultural e esportiva em benefício a população, nesta semana foi dada a largada para a “4ª Semana Ticket de Cultura & Lazer” com um show de Mariana Aydar no HSBC Brasil, onde o ator e humorista Eduardo Martini apresentou o evento com total criatividade elevando ainda mais o nível do nosso teatro e música.

No último dia 5 o HSBC Brasil, na zona sul de São Paulo, recebeu a proposta cultural da Ticket, no espaço estavam pessoas que adquiriram os ingressos gratuitos, Eduardo Martini apresentou a abertura da semana com sua famosa irreverencia, interagindo com o público o ator entrou pela plateia bem maltrapilho, tudo propositalmente para mostrar o quanto a cultura e o esporte precisam aproximar-se de todos, no palco ele cantou a música “Decididamente”, de Vinícius de Moraes e Edu Lobo, que foi interpretada por Marco Nanini no musical “Deus lhe Pague”, a canção foi bem arranjada e teve a interpretação de Eduardo que dançou e nos deu o sabor de um sambinha cômico e irônico. Eu precisei aplaudir de pé essa iniciativa da empresa, pouco se vê hoje em dia esse incentivo à cultura, eu que sou apaixonado por teatro e música não poderia perder o evento.

A cantora Mariana Aydar abriu seu show logo após as apresentações teatrais no HSBC Brasil, porém não houve o sincronismo necessário para uma apresentação perfeita, os músicos da banda e a cantora demoraram para entrar ao palco, após a abertura das cortinas, o volume estava alto demais e estourava os agudos. A iluminação ficou muito bem desenhada, o repertório incluía o sucesso “Vai vadiar”, de Zeca Pagodinho, além de outras canções que destacavam uma bela percussão. Alguns fãs de Mariana clamavam a cantora antes mesmo de sua apresentação, por vezes atrapalhando o número de outros artistas, porém foram elegantemente alertados por Eduardo, que demonstrou um fino traqueje de direção e arte.

Espero que a iniciativa da Ticket, que já chega ao quarto ano, possa servir de espelho a outras empresas, e que a evolução deste tão importante incentivo alcance um nobre índice. Acredito que se as apresentações se concentrassem em apenas um local exclusivo para a Ticket o deslocamento das pessoas seria mais fácil e a identidade da empresa estaria melhor carimbada. A ausência de um esportista e um literário, ou escritor no dia da abertura do evento deixaram uma lacuna na proposta da Semana, porém fica como uma dica para os próximos anos. O diretor de marketing da Ticket, Gustavo Chicarino brindou o evento com palavras de afeto à cultura e ao esporte, ao lado de Eduardo Martini que o complementou com a apresentação de uma ótima edição do video promocional e motivacional da Ticket.

A 4ª Semana é na verdade um semanão que vai até o dia 15 deste mês concentrando mais de 200 apresentações em pontos da cidade peças teatrais, exibições de filmes como “O Ano em que Meus Pais Saíram de Férias”, de Cao Hamburguer, além do Circo Zanni e uma biblioteca móvel itinerante com apoio da Itapemirim. A Praça Victor Civita, os museus de Arte Moderna e Arte Contemporânea e os CEUs recebem a programação. Maiores informações e imagens estão no site da Ticket, em sites de relacionamento e no http://www.semanaticketcultura.com.br/. Este não é um texto de promoção a empresa, mas sim aplausos ao projeto e uma retórica do apoio a cultura, a qual represento como crítico.