São Paulo parecia ter apagado as luzes de casa e saído às
ruas. No palco da Estação da Luz um mar de crianças tomavam a frente do grupo
Palavra Cantada e erguiam suas mãozinhas em aplausos. Mais adiante, Daniela
Mercury cortava a fita de mais uma edição do evento mais cultural da capital
paulista, e também um dos mais violentos. O que é uma pena, pois nem todos
usufruem de seus próprios investimentos de maneira política.
Daniela desfilou o mais fino da bossa nova no palco em
frente a monumental Sala São Paulo. Com o imenso relógio anunciando o tempo lá
no alto da torre, Daniela pairava o silêncio com “Ave Maria” pelas barulhentas
ruas da cidade. Terra que acolheu seu timbre debaixo do vão do MASP há tempos,
quando sua carreira já apontava o notável sucesso. “O Canto da Cidade” apagaria
as luzes do palco para Gal Costa tomar o posto. Mas... ops! O Senador foi
roubado!
Eduardo Suplicy, atual senador de São Paulo, pelo PT, enquanto assistia ao show da baiana, teve sua carteira e celular roubados. A cantora levou-o ao palco e fez um apelo: “por favor, devolvam pelo menos os documentos do senador”. Apenas os documentos foram recuperados. Ele continuou ali, pois a maior voz do Brasil estava por subir ao palco.
Eduardo Suplicy, atual senador de São Paulo, pelo PT, enquanto assistia ao show da baiana, teve sua carteira e celular roubados. A cantora levou-o ao palco e fez um apelo: “por favor, devolvam pelo menos os documentos do senador”. Apenas os documentos foram recuperados. Ele continuou ali, pois a maior voz do Brasil estava por subir ao palco.
Gal Costa passou uma navalha no tempo e colocou aquele mar de gente pra cantar
a uma só voz. Quase o show “Recanto” inteiro foi apresentado, e a guitarra de
Pedro Baby foi longe rua afora. Gal conversou com o público, deu esporro na
imprensa que entrevistava convidados em frente ao palco, e entregou o microfone
ao público para cantar “Força Estranha”. Caetano Veloso estava na voz de Gal,
estava na boca do povo em “Baby”. Era como se voltássemos no tempo, e em torno
daqueles festivais, tudo estivesse de volta. Gal incendiou a praça das músicas
clássicas, com as sarjetas e as eletrônicas de Caetano.
A marola das maconhas, dos cigarrinhos e o cheiro do álcool químico baforava por jovens e trilhava todo o centro histórico. A repetição de todas as outras edições do evento. Brigas pelo caminho, arrastões com uma leva gigantesca de pivetes. Meninas mostrando tudo que poderia estar coberto, rapazes quase sem idade e quase sem vida. Mortos no bolso da cultura. São as pedras que qualquer rio tem que desviar. Faltou policiamento em diversos pontos, luz e olhos atentos. Faltou sensatez da mãe que deixa sua cria cuspida sair de casa, de quem não sabe o que é diversão, dinheiro público e o limite do outro.
Preferi o sossego. A tranquilidade pra deixar de lado a tensão dos arrastões e comas alcóolicos. Não foi no Piano da Praça Dom José Gaspar... fui ao Mercado Municipal, em plena madrugada, ao deleite do chopp ouvir chorinho. Ouvir a poeira sair dos bandolins. O pandeiro chorar e Bruna Rodrigues exalar o perfume de sua voz. No mesmo palco nascia a nostalgia daquela manhã ainda acesa pela lua... Roberto Seresteiro e o grupo Regional Imperial rasgaram as partituras de Noel, Orlando Silva e Vanzolini tirando do papel o som de suas serestas e choros. Uma voz de tornar qualquer sereno, e um baile de estrelas no céu ainda mais bonito. O rapaz que canta com as mãos e o sorriso no rosto, com os olhos calçados por debaixo do chapéu e a soberana lembrança das vitrolas e gramofones renascidos em seu gogó.
O dia estava por raiar e tudo continuaria. Os maus elementos
teriam suas faces reveladas. As crianças despertariam os coretos. Os transportes
carregariam mais ouvidos atônitos e olhares aguçados.
O dia nascia com Elza Soares e Gaby Amarantos amarrando a
manhã com esplendor. A noite, mais uma vez cairia, desta vez com o Fundo de
Quintal na República e uma fila extensa de bandidinhos na porta da delegacia.
Fotos: Bárbara Almeida / Riziane Otoni
Parabéns pela matéria!
ResponderExcluir