É
claro que Chico Buarque ajudou no adjetivo a Criolo, em um de seus shows
parafraseando o próprio MC, em uma paródia feita sobre “Cálice”, sucesso de
Burque e Gilberto Gil. O que sai de Buarque é lei. Criolo é o mais recente MC
que ganhou âmbito nacional poetizando o dilema das periferias em suas próprias
canções. O MC, como são chamamos os rappers no Brasil, saiu com três troféus no 23º Prêmio da Música Brasileira, no mês
passado, e tem feito sucesso com seu álbum “Nó na Orelha”.
Kleber Cavalcante Gomes, o Criolo, foi
criado na comunidade das Imbuias, região do extremo sul de São Paulo. Seu pai é
metalúrgico e a mãe formada em diversas áreas, ambos são cearenses. A mãe
estudou com ele, na mesma clase, durante todo o Ensino Médio, na época
“Colegial”, e hoje promove encontros literários e filosóficos. Irmão de mais 4,
Criolo é fruto de uma poetisa de palavras e espírito, aos onze anos, numa ida
ao colégio, conheceu a poesia nas mãos dos meninos que a compunham e por ela se
encantou. Nas rádios a poesia tinha o nome de rap.
Sua mãe sempre gostou das letras, e
deu-lhe este gene em caráter hereditário. Há um bom tempo, quando comprava-se
carnes os açougueiros embrulavam as compras em folhas de jornais, e ela corria
para casa na tentativa de ler o conteúdo do periódico, antes que o suor e o
sangue da carne o sucumbisse.
Criolo
também faz sucesso porque não banha-se dos holofotes, tampouco prioriza os
endereços onde as pessoas vivem. Sua origem humilde permite-lhe compartilhar a
simplicidade e a intelectualidade de sua música com o público e o torna produto
do meio, deixando a filosofia de lado, digo-lhe como produto, não em mercadoria,
mas em letras. O último álbum lançado, “Nó na Orelha”, tem todas as faixas
disponíveis para download na internet, e foi produzido pelos parceiros Marcelo
Cabral e Daniel Ganjaman.
Este
cara, que veio a somar nos gênios das composições, ouvia música em vinil e
ainda defende a qualidade intimista que os acetatos emitiam. Ele, inclusive,
reunia pessoas para ouvir os clássicos Lps. No bairro do Grajaú, região sul de
São Paulo, cadenciou sambas com o grupo do Pagode da 27, batucantes do samba no
coração da periferia desta imensa capital, que sempre lhe serviu de inspiração
em composições como “Não Existe Amor em SP”, que lhe rendeu a frase dita e
compartilhada por milhares de brasileiros, e que foi também cantada ao lado de
Caetano Veloso.
Criolo,
com sua voz, que vai ganhando sotaque ao gingado da conversa, ainda recebe
cartas no mesmo endereço no Grajaú, enquanto viaja pelo Brasil e o mundo
mostrando a que veio. Aparece no Pagode da 27 para misturar rap, música popular
e samba num jeito bosseiro da música de periferia, que cada vez mais ganha
frequência nas rádios e downloads na mídia eletrônica.
“Nó
na Orelha” é um belo quadro que qualquer dona de casa e a moçada pendura na
parede para admirar de acordo com sua interpretação e sua cultura, com palavras
bem cursivas e frases elaboradas ao timbre pitoresco e aos acordes de
instrumentos bem reservados ao gênero eletrizado do rap, vão passando de faixas
diversas misturas de uma nova característica que só o seu rap tem, casado aos
ritmos oriundos de qualquer extremo do Brasil e encontrando numa só artéria, a
principal: boa música!
Mulato,
branco, amarelo, negro de pele mameluca, pardo e com a sensibilidade de um
poeta, há todo tipo de mistura em sua veia musical. Sua origem é como a de todo
mundano cancioneiro, ele nasceu dos olhos do mundo, numa lágrima de sofrimento
dos pobres, e no sorriso deles em sua riqueza de sons e sentidos.
Gravado
por um amigo, Criolo cantou uma paródia feita da canção “Cálice”, de Chico
Buarque e Gilberto Gil, exumando o sofrimento que a canção exprime em
interpretação e jorrando educação cívica. Uma das estrofes dessa composição
parafraseada pelo MC diz: “Os saraus tiveram que invadir os botecos, pois biblioteca
não era lugar de poesia.
Biblioteca tinha que ter silêncio,
e uma gente que se
acha assim muito sabida”.
Essa
recomposição, feita por Criolo, foi cantada por Chico Buarque em um de seus
shows e emendada a um agradecimento cantado em forma de rap ao MC.
Criolo trouxe
uma canção da década de 70 para sua formalidade contemporânea e deu voz ao
morro na intelectualidade Buarquiana, através da qualidade sensorial de sua
música. Acabo de dizer isso, mas repito, Criolo faz a canção sensorial.
Na
última edição do Prêmio da Música Brasileira, que homenageou João Bosco, onde
Cauby Peixoto e Alcione receberam o prêmio de melhores cantores em suas
categorias, Criolo recebeu o prêmio de Melhor Cantor e pelo Melhor Álbum na
categoria HipHop, além de Artista Revelação.
Sua
alimentação musical permite uma qualidade técnica simples e de total
formalidade em composição. Criolo tem a voz calma e as canções variáveis em
rígidas e sensíveis, pelo caráter poético e também incisivo ao morro que ele dá
voz.
Hoje ele passeia pelo mundo, enquanto o mundo passeia em sua
mente!
Nenhum comentário:
Postar um comentário