terça-feira, 17 de julho de 2012

Criolo, um nó na orelha, um rap de Buarque


É claro que Chico Buarque ajudou no adjetivo a Criolo, em um de seus shows parafraseando o próprio MC, em uma paródia feita sobre “Cálice”, sucesso de Burque e Gilberto Gil. O que sai de Buarque é lei. Criolo é o mais recente MC que ganhou âmbito nacional poetizando o dilema das periferias em suas próprias canções. O MC, como são chamamos os rappers no Brasil, saiu com três troféus no 23º Prêmio da Música Brasileira, no mês passado, e tem feito sucesso com seu álbum “Nó na Orelha”.

Kleber Cavalcante Gomes, o Criolo, foi criado na comunidade das Imbuias, região do extremo sul de São Paulo. Seu pai é metalúrgico e a mãe formada em diversas áreas, ambos são cearenses. A mãe estudou com ele, na mesma clase, durante todo o Ensino Médio, na época “Colegial”, e hoje promove encontros literários e filosóficos. Irmão de mais 4, Criolo é fruto de uma poetisa de palavras e espírito, aos onze anos, numa ida ao colégio, conheceu a poesia nas mãos dos meninos que a compunham e por ela se encantou. Nas rádios a poesia tinha o nome de rap.

Sua mãe sempre gostou das letras, e deu-lhe este gene em caráter hereditário. Há um bom tempo, quando comprava-se carnes os açougueiros embrulavam as compras em folhas de jornais, e ela corria para casa na tentativa de ler o conteúdo do periódico, antes que o suor e o sangue da carne o sucumbisse.

Criolo também faz sucesso porque não banha-se dos holofotes, tampouco prioriza os endereços onde as pessoas vivem. Sua origem humilde permite-lhe compartilhar a simplicidade e a intelectualidade de sua música com o público e o torna produto do meio, deixando a filosofia de lado, digo-lhe como produto, não em mercadoria, mas em letras. O último álbum lançado, “Nó na Orelha”, tem todas as faixas disponíveis para download na internet, e foi produzido pelos parceiros Marcelo Cabral e Daniel Ganjaman.
Este cara, que veio a somar nos gênios das composições, ouvia música em vinil e ainda defende a qualidade intimista que os acetatos emitiam. Ele, inclusive, reunia pessoas para ouvir os clássicos Lps. No bairro do Grajaú, região sul de São Paulo, cadenciou sambas com o grupo do Pagode da 27, batucantes do samba no coração da periferia desta imensa capital, que sempre lhe serviu de inspiração em composições como “Não Existe Amor em SP”, que lhe rendeu a frase dita e compartilhada por milhares de brasileiros, e que foi também cantada ao lado de Caetano Veloso.

Criolo, com sua voz, que vai ganhando sotaque ao gingado da conversa, ainda recebe cartas no mesmo endereço no Grajaú, enquanto viaja pelo Brasil e o mundo mostrando a que veio. Aparece no Pagode da 27 para misturar rap, música popular e samba num jeito bosseiro da música de periferia, que cada vez mais ganha frequência nas rádios e downloads na mídia eletrônica.

“Nó na Orelha” é um belo quadro que qualquer dona de casa e a moçada pendura na parede para admirar de acordo com sua interpretação e sua cultura, com palavras bem cursivas e frases elaboradas ao timbre pitoresco e aos acordes de instrumentos bem reservados ao gênero eletrizado do rap, vão passando de faixas diversas misturas de uma nova característica que só o seu rap tem, casado aos ritmos oriundos de qualquer extremo do Brasil e encontrando numa só artéria, a principal: boa música!

Mulato, branco, amarelo, negro de pele mameluca, pardo e com a sensibilidade de um poeta, há todo tipo de mistura em sua veia musical. Sua origem é como a de todo mundano cancioneiro, ele nasceu dos olhos do mundo, numa lágrima de sofrimento dos pobres, e no sorriso deles em sua riqueza de sons e sentidos.

Gravado por um amigo, Criolo cantou uma paródia feita da canção “Cálice”, de Chico Buarque e Gilberto Gil, exumando o sofrimento que a canção exprime em interpretação e jorrando educação cívica. Uma das estrofes dessa composição parafraseada pelo MC diz: “Os saraus tiveram que invadir os botecos, pois biblioteca não era lugar de poesia.
Biblioteca tinha que ter silêncio,
e uma gente que se acha assim muito sabida”.

Essa recomposição, feita por Criolo, foi cantada por Chico Buarque em um de seus shows e emendada a um agradecimento cantado em forma de rap ao MC.

Criolo trouxe uma canção da década de 70 para sua formalidade contemporânea e deu voz ao morro na intelectualidade Buarquiana, através da qualidade sensorial de sua música. Acabo de dizer isso, mas repito, Criolo faz a canção sensorial.
Na última edição do Prêmio da Música Brasileira, que homenageou João Bosco, onde Cauby Peixoto e Alcione receberam o prêmio de melhores cantores em suas categorias, Criolo recebeu o prêmio de Melhor Cantor e pelo Melhor Álbum na categoria HipHop, além de Artista Revelação.

Sua alimentação musical permite uma qualidade técnica simples e de total formalidade em composição. Criolo tem a voz calma e as canções variáveis em rígidas e sensíveis, pelo caráter poético e também incisivo ao morro que ele dá voz.

Hoje ele passeia pelo mundo, enquanto o mundo passeia em sua mente!



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