segunda-feira, 13 de agosto de 2012

Sergio Dumont e um som que sai do oco violão


O sotaque de um vestígio chiado retrocede à década de 60, enquanto definia-se a suntuosidade presidencial da casa da república depondo-se da Guanabara, e Sergio Dumont encontra-se em seu violão carioca e o timbre sussurrado, ecoando pelos espaços entre as cordas e os acordes. Mas, voa-se imediatamente para um sul de qualquer verde, mato, serra e água doce que corre, é um significado que encontrei pras canções de seu álbum, que estampa seu nome e a mineira Tiradentes, em casebres, ladeiras e a pauta das faixas musicadas.

Com a licença de um sax soprano a “Vida”, primeira faixa, nasce nas teclas de um piano e todo o acorde que acompanha, como se cheirando café e bolo de fubá, esperasse a novela das seis começar só pra ouvir a canção que abre. A maioria das faixas do álbum são composições de Dumont.

O CD é “Sergio Dumont”, por ele próprio, com as participações diamantadas de Flavio Venturini e a saudosa voz de Jane Duboc.

Não é pra ouvir e decorar, nem vamos sair cantando quando alguém pedir a referência de uma canção pra ouvir no pôr do sol. Aliás, eu nunca gostei de pôr do sol, acho o entardecer tão triste, indefinido entre dia e noite. As canções de Dumont são um cisco poético batidos no violão, é um instrumento de destaque, que romantiza tudo que toca no álbum.
Às vezes parece que vai surgir um bolerinho, mas esmaece, e o tom do arranjo vai caindo para uma serenidade monótona, de repente, sobe outra vez. Ficaria bonito um bolero nesse álbum, é um som que ganhou tanto espaço dentre as vozes brasileiras, que posso imaginar Sergio Dumont cantando um com uma doçura perfeita.

“Beija-Flor” é um encontro com a faixa seguinte, “Vila Rica”, que entroncam uma beleza instrumentada e a voz sorrateira e aveludada de Dumont.

Enquanto abre-se o livreto do CD, encontram-se imagens da cidade de Tiradentes, em Minas Gerais, absorvendo as canções para uma realidade interiorana, de céu azul e pés na terra. Pelas janelinhas azuis salta o gingado da voz de Dumont, variado na calmaria da canção mineira. Nem sei porque, mas é um encontro sossegado e aconchegante.

Às vezes sinto falta de um pouco de volúpia nas partituras, e uma letra mais sonorizada. É bacana compor pensando na sonoridade final da letra. Porém logo vem “La Vie En Rose”, de Edith Piaf, e envolve no veludo carioca de Dumont, um francês cheio de sortilégios e com uma afinação venerável. Falando em francês, as músicas de Sergio Dumont são ambientadas no famoso restaurante Maxim’s, em Paris, de propriedade de Pierre Cardin. Por lá andava Santos Dumont, que deixou a marca da sola de seus embicados sapatos a sorte para a entrada de Sergio e sua brasileira canção, após anos de sua peregrinação de amor à França.
O “Tema Número 1” encerra o álbum com um gostoso encontro de instrumentos, e amarra o laço que antes trouxe a saudosa Jane Duboc numa explosão de timbre em “Realeza Vulgar”, azeitando a canção com a finesse de sua voz.  Antes, ainda, Flavio Venturini desmonta o Céu de Santo Amaro, que cadencia uma de suas mais belas destiladas da voz no eixo musical, para dividir o microfone com Dumont em “Sonhei Demais”, letra que configura um perfeito e suave duelo entre os cantores.

Sinto falta de mais variação no álbum, de uma quebra de ritmo, mesmo havendo uma boa exploração dos instrumentos, mas o CD segue numa quebrada só. Acredito que isso tenha ficado mais para uma época de Bossa Nova, onde era a cadência dessa linearidade das canções. Sergio Dumont tem uma voz criativa, íntima e que passa pelos lábios antes de explodir pelas partículas do ar. O grisalho da barba cerrada e do cabelo batido impõe um respeito, e recortam uma fotografia sépia na paisagem.

Siga em frente, dividindo entre as cordas e a voz o cisco poético de suas canções! E obrigado pela dedicatória na capa do CD, ele está bem acompanhado, ao lado dos menestréis da seresta, entre a bala na agulha de Cauby, Gal, João Gilberto e Bethânia. CDs que recebo e enfileiro para sempre escutá-los.

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