No
último final de semana, Elza Soares apresentou seu show “Deixa a Nega Gingar”,
no Teatro Anchieta, do Sesc Consolação, em São Paulo e surpreendeu a plateia
cantando ao lado da banda Huaska, com rock e bossa nova. A cantora do milênio
não deixou faltar voz, e fez um dos melhores shows dentre diversos artistas da
música.
Ao
lado do músico JP Silva, que também produz o show, Elza espalhou sucessos no
palco. Quando o cenário de luzes descortinou, ela estava de pé, recém-operada
da coluna, Elza passou o show sentada e o abriu escandalizando com maestria em
“Opinião”, de Zé Keti. Mas ela estava inquieta, o espaço da cadeira era muito
pouco e Elza levantava as pernas, apoiada, levantava-se e arriscava um rebolado.
“O Meu Guri”, de Chico Buarque foi acompanhado de muitos aplausos, e com
direito a uma parada para agradecer o público e continuar esbanjando voz. Ainda
vieram “Amor Perfeito”, “Nega do Cabelo Duro”, com uma levada eletrônica, e
“Beija-me”, de Roberto Martins e Mário Rossi. Elza colocou um show na história,
e o que parecia ser tão intimista, para um pequeno teatro, deixou o público de
pé, sambando e cantando.
Elza
Soares nasceu na favela da Moça Bonita, em Padre Miguel, no Rio de Janeiro.
Filha do operário Avelino, que também tocava violão, e da lavadeira Rosária,
teve uma infância pobre e difícil. Elza trabalhava carregando latas d’água na
cabeça, e aos 12 anos teve que largar os estudos para casar-se, por decisão do
pai. Com 13 anos, teve o primeiro filho que morreu desnutrido. Na mesma época
ela participou do programa de rádio, na Tupi, de Ary Barroso, estreando como
caloura. Ary duvidou do talento de uma mulher trajada de um vestidinho e
sandálias batidas, interrogando-a de que planeta ela havia saído. Elza
respondeu: “do mesmo que o seu, o planeta fome”. Elza deu a canja, e Ary
anunciou que ali nascia uma estrela.
Sua
rouquidão surgiu de quando ela carregava as latas na cabeça, que a fazia emitir
alguns sons. Aos 14 anos Elza engravidou novamente, este filho também faleceu
por fome. Com 5 filhos, aos 20 anos de idade, a necessidade continuava a lhe
bater na porta. Um dos filhos foi doado para uma família, pela falta de
condições para criá-lo. Elza também trabalhou como encaixotadora numa fábrica,
perdeu o marido e começou a cantar nos bares cariocas. Também foi doméstica,
lavadeira e passadeira. Casou-se com Garrincha, famoso jogador de futebol, com
quem sofreu muito durante os 16 anos de casados. Garrincha era alcoólatra e
separou-se da mulher para viver com Elza. Ela foi muito recriminada na época,
percorria bares suplicando para que não dessem bebida a ele, que faleceu em 83,
com cirrose. Com ele, tiveram um filho, que morreu num acidente de carro aos 9
anos. Com quadro depressivo, Elza Soares foi morar fora do Brasil, e entre os
Estados Unidos e a Europa fez sucesso. No Chile, conheceu Louis Armstrong, que
lhe ensinou a fazer o “scat”, sons que remetem a um instrumento, porém emitidos
pela própria voz.
O
primeiro disco de Elza Soares veio em 1960, pela Odeon, desde então seu
reconhecimento velejou o mundo todo. Em 2000 apresentou-se ao lado de Gal
Costa, Chico Buarque, Gilberto Gil, Caetano Veloso e Virgínia Rodrigues, quando
foi eleita, pela BBC de Londres, como a Cantora do Milênio. Elza também foi a
primeira mulher a puxar um samba-enredo. É uma das artistas mais respeitadas no
mundo da música, e com uma das mais impecáveis vozes. Em São Paulo, lançou o
cantor Vander Lee, e agora colocou JP Silva no palco. Na capital paulista,
chegou a frequentar o Madame Satã, que reunia a gama roqueira numa casa, e para
relembrar isso trouxe para o samba o grupo de rock Huaska, em seu último show,
que teve direito às entradas eletrônicas no ritmo.
O
show “Deixa a Nega Gingar” é um projeto espetacular, que deixou-me boquiaberto.
Canções que carimbaram a carreira de Elza, voltaram à tona naquela voz
alucinante. O som estava alto para o espaço do teatro, mas com o tempo os
ouvidos foram habituando-se ao deslumbre do repertório., que incluía “A Flor e
o Espinho”, de Nelson Cavaquinho, o sucesso “A Carne”, de Seu Jorge, Marcelo
Yuca e Wilson Capellette, além de “Com que Roupa?”, de Noel Rosa, “Chove Chuva”
e “Mas que Nada”, de Jorge Ben, “Espumas ao Vento”, de Flávio José, que foi
cantada a cappella com uma sonoridade extraída do próprio “gogó” da cantora, e
“Madalena”, de Ivan Lins e Ronaldo Monteiro. Com JP, também fez um dueto
inesquecível de “As Rosas Não Falam”, de Cartola.
Outros
sucessos foram cantados também, até que a banda Huaska pisou ao palco para tremer
com tudo, nem a letra parava na folha, que voava pelo chão. Com uma melodia
viva, o tom afinado e letra impecável, ao lado de Elza, eles cantaram “Samba de
Preto”, composição conjunta da própria banda. Enquanto o samba fazia-se
sorrateiro, no pé, um acorde estrondoso saiu da guitarra embalando o heavy
metal com repiques e batuques. A banda de Rafael Moromizato, Alessandro Manso,
Carlos Milhomem, Caio Veloso e Júlio Mucci, botou pra quebrar e disparou
aplausos de todas as idades do público. Recomendo que busquem o CD dos meninos.
Além do rock, os sintetizadores eletrônicos de Ricardo Muralha casaram-se com
um mix de ritmos enlaçados por Elza.
Fazendo
o “scat” , Elza parecia estar com o baixo na garganta, e o baixista com a
imensa responsabilidade de tirar o som nas cordas, que Elza mandava com a voz. “Malandro”,
de Jorge Aragão, foi a primeira música que ela gravou dele, apadrinhando o
cantor, e a canção que virou um hit em sua voz, não ficou de fora do show, que
encerrou-se com “Vou Festejar”, de Neoci, Dida e Aragão, com o teatro caindo no
samba e Elza recusando-se a sair do palco. Mandando beijos, reunindo sua banda,
o eletrônico e o rock, ela despediu-se, mostrando a que veio, e fazendo jus ao
título de cantora do milênio. Elza Soares é tudo junto num samba, que jamais
deixará de requisitar sua tremenda voz.
Maravilhoso post.
ResponderExcluirAcho que só que viu esse show de Elza, sabe do que vc está falando.
Como costumo dizer, que sorte que o 'planeta fome' nos presenteou com essa maravilhosa cantora.
Pra mim, sinônimo de mulher tem nome: Elza Soares.
Olá,
ResponderExcluirAchei esse blog enquanto procurava aconteúdos relacionados a Elza Soares. Muito interessante a postagem!
Abraços,
Lu Oliveira
www.luoliveiraoficial.com.br