Dos
meus olhos minavam água, de beber ou de benzer camará, mas eram lágrimas doces
que destilavam-se feito o uísque do velho poeta. Era a música de Vinícius de
Moraes exalando pelo corpo, exumando todo o mundo, e isolando-nos ao Auditório
Ibirapuera, na noite do último sábado (6), em São Paulo. Lá dentro, um dos
maiores espetáculos, em grandeza musical e emocional, tiravam a letra de
Vininha do papel e reinventavam uma nova noite com o poeta.
Na
abertura do espetáculo, o Coro da Escola do Auditório Ibirapuera desfilou
canções em um controle de timbres impecável. Ousaram cantar “Dora” com os pés
descalços e a vibratilidade de inúmeras vozes, Caymmi abria os trabalhos para
Vinícius de Moraes.
Quando
aquele bocado de gente entrou no palco, fazendo valer a máxima de melhor coro
de São Paulo, Vinícius parecia sentar novamente em sua cadeira e preencher o
corpo de uísque e os nossos de poesia. O maior poeta do Brasil, em minha
opinião, descia do céu em voz!
Fabiana
Cozza, a voz do samba, o coro monólogo feminino do palco, revestiu-nos com um
timbre de causar arrepios. Ô, nega... você levou meu coração contigo. Feito um
monumento de notas, cantou “Berimbau” arrancando além das três notas que o
instrumento comporta.
Jean
William, o jovem tenor, jogava pela boca notas em palavras enquanto sorria.
Seus olhos gritavam um brilho que respingava em um por um de nós, humildezinhos
na plateia. O menino ficou gigante!
O
jornalista e ator Oswaldo Mendes contava com poesia, e não poderia ser
diferente, rasgando sua voz marcante feito o cortar de uma seda molhada,
recontando os caminhos do poeta. Até Fred Rossi, o último empresário de
Vinícius, reviveu seus intensos momentos ao lado da mesinha e do inseparável
uísque do amigo.
A
orquestra não poupou notas, suor e coração. Martinho Lutero divertia as mãos à
regência daquele batalhão vocal sobre o palco e parecia tirar dos dedos a
alegria de Vinícius.
Teco
Cardoso soprava mais do que um som, soprava tudo que havia dentro de si. No
piano, renascia uma partitura que nunca envelheceu, Hércules Gomes tratou das
teclas como deve-se tratar a própria vida.
Poucas
vezes, raríssimas vezes, encantei-me outra vez com o poeta. É uma raridade um
encontro desses. Ficou lá, a solitária mesinha de Vinícius, só não tão só
porque o uísque entornava-se sobre ela, como nos velhos tempos. Saudades do
maior!
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