Escrevo apaixonado, pela música, pelo menos duas vezes por semana. Por alguns anos repeti esse ato, esse despejo consciente de um amor entre eu e os sons. O som das vozes, dos teclados, das cordas, da percussão e dos sopros. Um dos instrumentos mais tocados no mundo, as vezes cai na rotina e a gente esquece que o compasso dele fica de fora. Todos nós sabemos tocar, muitas vezes fora de ritmo, sem tom, mas muitas vezes com uma percussão ritmada. Tem coração dentro de todo mundo, tem instrumento dentro de todo mundo, não dá pra dizer que não sabemos tocar nada. É a primeira vez que escrevo sobre o meu coração e dou o nome disso de coluna sobre música!
A música traz nossos primeiros lembretes sensoriais. As primeiras trilhas sonoras sexuais e escrevem aquilo que já vivemos. Sinto que Tom Jobim compôs o que eu queria dizer e Caetano deu pra Gal a canção que eu gostaria de ter dado. Parece que Bethânia canta com a letra que eu pensei em escrever. Essa gente toda canta por nós e a gente toca, com o coração, fica acompanhando com ele batendo, no mesmo compasso do cérebro, dos ouvidos. O sangue vai pulsando feito os poros da pele engolindo o resmungo do som. É a sensação da paixão... ou do amor. No meu caso, do amor! Pela música, pelo humano, pelo que toca, pelo que fala, pelo que canta, pelo que ouve ao meu lado, enquanto espreme os dedos de minhas mãos, respondendo aos vibratos de qualquer canção que sai do iTunes, do Youtube, do sei lá do que... do rádio!
Por vezes, basta-nos passar o fone de ouvidos de um ouvido para o outro, como quem passa a língua de boca para boca. É um ato de amor, é o sexo da música com os ouvidos. É preciso falar tanto, pra não parecer que estou dedicando este texto a uma banalidade. Tem gente que banaliza o amor, faz ele ruminar como um disco cheio de riscos. Eu, dou-lhe o valor, o do som. O do som do coração. Ele bate sem precisar de música, porque ele aprendeu a bater por estímulo de algo que não é o som. Aprendeu com o toque de uma mão, o solfejo de palavras, o palpite, o roçar de pés, o beijo, ou o simples ato de admirar, orgulhar-se... de amar! Eu te amo... e digo publicamente. Eu amo quem me ama! E isso torna-me música, composta pelo meu coração.
Tenho uma banda, uma banda de dois. Uma dupla! Dois corações quando batem juntos, fazem o que o meu e o do meu amor fazem. Batem e formam um som uniforme. Meu coração aprendeu a ter compasso. Não necessariamente com o estímulo de um marca-passo. Mas com o passo marcado do que um sente pelo outro. A música acompanha, a música transita pelos homens que amam. Eu ouço o que você ouve, e você ouve o que eu ouço. E a música corrói novos poros. Conhece ao outro, quando ouve-se o outro. E música é a voz do outro. É a voz do humano.
Eu comecei a amar pela música. Num show de Gal... passei a usar a palavra felicidade só após senti-la e tive inveja do Tom... o Jobim, por suas composições usando felicidade relacionada ao amor. Mas, foi lá na boca do palco que senti vontade de beijar. Sexo, fácil caminho que a música torna tácito. O sexo e a música andam pelos dedos sobre a cama. Amor e sexo, como disse Rita Lee! É isso, ela definiu tudo muito bem.
Quero casar, como quem sobrepõe dois discos. Quero riscar a aliança na pele do dedo. Primeiro em uma mão, depois na outra. Quero que o sol queime as redondezas dos dedos, em volta da aliança. Quando mudarmos de dedo, as alianças, todos saberão que namoramos e depois casamos. Que queimamos os pelos das pernas um no corpo do outro na molequeira escondida dos finais de semana, quando ninguém ouvia nossos urros e acham que apenas ouvíamos música no quarto, com o volume alto. É por isso que não ouviam nossos urros. A música desvela o sexo enquanto oculta-o para os outros. Grite, enquanto aperto teu sexo, que lá embaixo ninguém vai ouvir!
Quando o meu coração começou a bater pela culpa de um outro, fiquei feliz por saber que eu também era músico. Que, ainda por cima, tocávamos juntos. O amor me ensinou não só a amar, a desejar, a admirar. Ensinou-me o ato de musicar.
O amor é o cafonico estado de tornar o corpo uma orquestra. O coração faz um arranjo de letras apaixonadas. A boca, pelo beijo engole notas. Fomos rápidos, porque a música não dura mais do que "Faroeste Caboclo", do que uma ária, do que uma peça de Verdi ou Chiquinha Gonzaga.
Conhecemo-nos justamente, com mais destreza, na plateia do show. Eu ouvia o seu coração tocar, enquanto ouvias o meu dar-lhe o tom. Somos plateia de nós mesmos. Encarcerados pelos próprios corpos.
Eu te amo! Independente das convenções e do que os outros vão achar. Case-se comigo... eu, você e a música. Esse "ménage à trois" ao sugo da nossa paixão.
Eu te amo. A música e você, que veio-me como ela.
É pro resto da vida, como um acetato bem cuidado. Não importo-me com o que os outros vão achar. Com a inversão sexual. Com a Comissão dos Direitos Humanos. Com o verbo de nossos pais. Com a repudia dos crentes e das oposições. Amo-te como quem ama! Maior que uma clave de sol e de fá no mesmo verso, amplificadas no silêncio.
Amo-te mais do que aquele dia na plateia da Gal. Amo-te mais do que diz na música do Tom Jobim e de Buarque, juntos. Vou te amar mais do que as canções que irei compor. Do jeitinho que o nosso coração bate, é nesse ritmo que eu te amo, aceleradamente!
Só não direi publicamente o seu nome, porque o coração dos seus pais pode parar. E quero que todos os corações batam! Só assim a música vai continuar viva. Um dia, abro novamente essa coluna só pra dizer o seu nome aos curiosos.
Case-se comigo?!