terça-feira, 20 de agosto de 2013

Filipe Catto entre cabelos, olhos e furacões


Um rapaz, que logo de cara parece indefeso. Mas, deixa escapar, sobretudo pelos olhos, sua veia interpretativa. Indefeso, até atirar com a voz. Com o rasgo ao silêncio e as grossuras em timbre de contratenor. Filipe Catto lança “Entre Cabelos, Olhos & Furacões”, que foi gravado no Auditório do Ibirapuera, sem economia de atuação e voz.

Terei que usar rompantes textuais, dedilhar pelo texto as cordas que intitulam o álbum de Catto. Em aspas caberão algo do que ouve-se, sente-se e inunda. Passa feito vento que surte no ouvido e seca a boca. Pasmificando e fazendo sortilégio com o coração. 

Catto veio lapidando-se pelas trilhas já consagradas e sapecou novidades cavalgadas numa voz que pode ser comparada com outras, sagradas, mas em um olhar único. Dançando o sangue por dentro do próprio corpo, que nem precisaria mover-se no palco. Mas, ainda sim, move-se! Catto faz-se único quando engole o palco.

O álbum, que já está à venda traz dezoito faixas, uma delas gravada em estúdio e as outras ao vivo.

Cada canção é um capítulo, é a terminação de uma ênfase. “Saga” é um tiro de dardo embriagado no peito. “Roupa do Corpo” é o ápice atingido pela delicada voz de Catto, um sambinha tipicamente contemporâneo e cheio da brilhantina do passado. “Eu te amo (And I Love Her)” é coisa de trilha de filme, de rádio... dá até saudade do que passou. Catto, com sua voz, leva-nos a um hipnotismo neste instante, a uma viagem retrógrada.

E não fica por aí, “Adoração” é uma adoração. A voz auto-adora. “Ave de Prata”, de Zé Ramalho, é uma composição poética, tornando lúdica a palavra e tácita a voz de Catto, que parece cair e espalhar-se em nossas mãos. É ela que dá título ao álbum. “A Sorte é Cega” tem um violão e uma levada contemplativa, suave e quase interiorana. Feito uma modinha.
“20 e Poucos Anos” é Catto... é um autorretrato composto há anos. Filipe Catto é mais que os seus vinte e poucos anos, sem dúvidas. “Mergulho” é de fato um mergulho, mas em uma certa monotonia, que acaba desagradando em instrumentação e voz, por prolongar-se em pouca variação. “Johnny, Jack & Jameson” é uma trinca de uísques, de fato. Catto canta acompanhado de Bluebell, que feito a flor vai desmanchando-se em voz e fertilizando o vocal de Filipe. É um número cheio de música.

Catto “é muito mais do que muito”. Expressões como “vagalume no mar”, ou “mar que se acaba na areia”... dão a profundidade desse álbum. Acende-se por onde não passa energia e dá tempo ao seco tomar-se do molhado. “É muito mais do que mata”, trucida, joga-nos à esquerda. Tonteia e derruba. Poeticamente, claro, e belo. “Mais do que bicho quando quer procriar”, é um incesto irresoluto entre a voz e corpo que estende-se à luz do palco. “Como é o silêncio?”, pode ser a pergunta que grita junto a voz do jovem Catto, que faz inútil o silêncio em sua presença.

As licenças poéticas utilizadas entre aspas, no parágrafo acima, acompanham o título do álbum, que transcende ao próprio criador.

“Entre cabelos, olhos e furacões” e nada mais!

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